27 Abril 2022
Críticos do Caminho Sinodal alemão estão fazendo ataques velados sobre o Papa Francisco e suas ambições por uma “Igreja que escuta”.
A reportagem é de Christopher Lamb, publicada por The Tablet, 22-04-2022. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Em 2001, o cardeal Jorge Mario Bergoglio foi escolhido no último minuto para assumir o papel-chave de moderador (relator-geral) da reunião dos Sínodo dos Bispos no Vaticano.
Ele substituía o cardeal Edward Egan, que havia voltado para os Estados Unidos devido aos ataques às Torres Gêmeas em 11 de setembro. Essa sua experiência na reunião dos bispos que convenceu o futuro Papa Francisco da urgente necessidade da Igreja para se aprofundar no entendimento do que significar se tornar verdadeiramente sinodal, com livre e aberta discussão e genuína abertura ao Espírito Santo.
Embora Francisco tenha dado passos decisivos nessa direção durante seu pontificado, uma carta aberta assinada por dezenas de bispos alertando que o Caminho Sinodal alemão pode levar ao cisma mostra o quão longe as coisas ainda precisam ir.
A disputa sobre o processo alemão agora se tornou uma guerra proxy sobre o papado de Francisco e a Igreja mais sinodal que ele está tentando criar.
Durante aquela assembleia sinodal em Roma, há mais de duas décadas, o trabalho de Bergoglio era “reunir o material” e “arrumá-lo”. Mas – como Francisco disse a um grupo de jesuítas em Malta no início deste mês – o então secretário-geral do sínodo, cardeal Jan Pieter Schotte, “removeria isso ou aquilo, que havia sido aprovado pelo voto dos vários grupos”.
“Houve coisas que ele não considerou apropriadas. Houve, em suma, uma pré-seleção de materiais”.
A abordagem de Schotte mostrou “uma falha em entender o que é um sínodo”, disse Francisco a seus colegas jesuítas. “Hoje, avançamos e não há como voltar atrás”. Ele tem razão. Os sínodos dos bispos desde que Francisco se tornou papa, nove anos atrás, viram uma troca de pontos de vista mais livre, um foco maior na escuta e um processo muito menos encenado.
As declarações do Papa em Malta foram publicadas por La Civiltà Cattolica três dias após a divulgação da carta acusando o Sínodo alemão de tomar o caminho errado. Os bispos – atualmente 92 deles – dizem que o “foco alemão sobre o ‘poder’ na Igreja sugere um espírito fundamentalmente em desacordo com a natureza real da vida cristã”.
No entanto, essa não é outra maneira de dizer que há algumas coisas que podem ser discutidas e outras que não podem? A mentalidade de insistir em uma “pré-seleção de materiais”, que Francisco lembrou ter acontecido em 2001, ainda é profunda. Além disso, parece haver uma falta de fé no processo de discernimento sinodal ao tentar intervir antes mesmo de sua conclusão. Os bispos não confiam no Papa para garantir que o Caminho Sinodal alemão caminhe com o resto da Igreja?
Até agora, os signatários incluem os cardeais Raymond Burke, George Pell e Francis Arinze, todos conservadores proeminentes, sendo Burke um dos principais críticos de Francisco. Eles também incluem dois bispos da Escócia (o arcebispo Leo Cushley e o bispo Stephen Robson) e um da Inglaterra e País de Gales (o bispo Mark Davies). Um nome surpresa é o arcebispo ganês Charles Palmer-Buckle, que no sínodo de 2015 falou a favor de dar comunhão aos católicos divorciados e recasados.
Esta não é a única carta de protesto contra o Caminho Sinodal alemão, tendo também o presidente da Conferência Episcopal Polonesa e os bispos nórdicos escrevendo cartas à Alemanha para expressar suas preocupações.
O objetivo dessas iniciativas é colocar pressão pública sobre os bispos alemães e o Papa para reduzir ou encerrar o processo sinodal. A última carta também inclui uma ameaça velada de que o exemplo da Alemanha “pode levar alguns bispos e muitos leigos fiéis a desconfiar da própria ideia de ‘sinodalidade’”. Em outras palavras: se a Alemanha não mudar seus caminhos, esperem resistência a todo o processo sinodal.
No entanto, os tópicos examinados pelo sínodo alemão – o uso do poder, o papel das mulheres na Igreja, o ministério sacerdotal e o ensino sexual católico – são todos tópicos que estão sendo levantados nas igrejas locais como parte do sínodo global. Eles não podem mais ser ignorados, particularmente à luz da crise de abuso sexual clerical.
Em resposta às críticas, dom Georg Bätzing, presidente da Conferência Episcopal Alemã, enfatizou que as causas subjacentes dos escândalos de abusos, incluindo o abuso de poder, devem ser enfrentadas. A crise não pode ser simplesmente “espiritualizada” como atos malignos cometidos por um indivíduo enquanto as estruturas, cultura e hábitos que não lidaram adequadamente com o abuso são deixados intocados.
Há muitas críticas que podem ser feitas ao caminho sinodal alemão, com o próprio Francisco pedindo aos católicos alemães em uma carta de 2019 que não “sigam sozinhos”. A carta dos bispos, no entanto, revela uma relutância e um medo em embarcar na jornada para se tornar uma Igreja sinodal.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Alemanha. Caminho Sinodal se torna a próxima batalha proxy sobre o papado de Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU